Faleceu na manhã desta quarta-feira, ao 77 anos de idade, vítima de um infarto, a cantora Gal Costa, uma das maiores vozes da música brasileira. Nascida em Salvador, Bahia, em 26 de setembro de 1945, Maria da Graça Costa Penna Burgos estreou nos palcos soteropolitanos em 1964. Já no ano seguinte, a cantora se apresentava nos palcos do Rio de Janeiro e gravava suas primeiras canções ao lado de Caetano Veloso e Gilberto Gil.
GAL SEMPRE ESTEVE A FRENTE DO SEU TEMPO
A voz de Gal Costa foi um marco na música brasileira. A forma como ela chegava com folga às regiões mais altas e seu timbre de cristal se tornaram uma das identidades artísticas mais fortes da MPB desde os anos 60, e seu poder de romper padrões quando bem dirigida era sua marca. Em Domingo, seu primeiro álbum, de 1967, Gal foi dirigida por Caetano Veloso. Havia ali a afirmação de sua admiração por João Gilberto ao mesmo tempo em que os dois apontavam para o seguimento de uma linhagem de canto joaogilbertiano modernizado. Coração Vagabundo, Avarandado, Um Dia e a própria Domingo, com arranjos de cordas, fizeram sua bela estreia, mas não a revelaram por inteiro. Gal tinha mais a mostrar.
Um ano depois, Gal, firmava-se como a voz feminina dos tropicalistas, algo que a posicionava ao lado do grupo renovador da música brasileira. Ela aparecia em três momentos no álbum coletivo Tropicália — Panis et Circencis, cantando Mamãe Coragem (de Caetano Veloso e Torquato Neto), Parque Industrial (de Tom Zé), Enquanto Seu Lobo Não Vem (de Caetano) e, algo que se fixaria a sua imagem com mais força, Baby (também de Caetano Veloso).
Baby estaria em seu álbum de 1969, considerado o primeiro solo, com uma personalidade cada vez mais sólida. Não Identificado, Sebastiana, Divino Maravilhoso e mesmo o soul de Roberto, Se Você Pensa, ainda com os arranjos de sopros que haviam marcado a década anterior, mostram que a passagem pela Tropicália era um caminho sem volta. Gal não se prendia a campos definidos.
Sua discografia mapeia momentos políticos graves do país. Fatal — Gal a Todo Vapor, de 1971, mostra o registro de um dos shows realizados no teatro Tereza Raquel, no Rio, dirigidos por Waly Salomão. Sem os parceiros Gil e Caetano, exilados em Londres, Gal construía outro ponto incontornável em seu crescimento.
Saiu dali um álbum lançado com imperfeições, mas com a alma do show, mostrando a cantora, mais uma vez, estendendo seu campo de atuação, lembrando Ismael Silva, Jorge Ben, Luiz Melodia (Pérola Negra foi um arraso) e Jards Macalé com o próprio Waly Salomão (Vapor Barato é o hit). Saíram ainda daquele momento Como Dois e Dois, de Caetano, e Sua Estupidez, de Roberto e Erasmo.
Gal conseguiu adentrar e passar pelos anos 80 com vitórias importantes. Ao contrário de artistas que penavam para transpassar o portal tecnológico imposto pela nova estética radiofônica logo no início da década (as rádios FM se tornavam um novo filtro), Gal foi absorvida imediatamente. Seu álbum de 1981 é um clássico dos tempos, com Canta Brasil; Meu Bem, Meu Mal; Faltando Um Pedaço; e a eterna Festa do Interior. Gal estava por todas as rádios, em trilhas de novelas e lançando discos quase sempre irretocáveis.
Quando chegou 2011 Caetano voltou a dirigir um álbum inteiro. O resultado foi Recanto, com uma cantora que parecia se reposicionar esteticamente.
Mas Gal só estava mais uma vez sendo ela, imprevisível, irrepetível, abandonando as expectativas que faziam sobre o que poderia ser seu álbum para entregar-se a uma sonoridade ruidosa e muitas vezes difícil até como base harmônica para se colocar a voz. Seu timbre e seus agudos já ganhavam outro corpo, mas sua alma seguia fazendo cada nota que escolhia ser a nota perfeita.
Ao longo de 57 anos de carreira, Gal lançou mais de 40 álbuns, entre trabalhos de estúdio e ao vivo. Em 2018, a cantora lançou seu último disco de canções inéditas, A Pele do Futuro, inspirado pelo filho Gabriel, 17 anos.
Seu último álbum lançado foi Nenhuma Dor, produzido durante a pandemia de covid-19. O disco traz a cantora interpretando clássicos de seu repertório em duetos com vozes masculinas — como Baby, com Tim Bernardes, Coração Vagabundo, com Rubel,e Meu Bem, Meu Mal, com Zeca Veloso.
Fonte: GZH
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